Da Alta Gastronomia à Cozinha Km zero.
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Da Alta Gastronomia à Cozinha Km zero.
Não pensem que a cozinha Km zero é algo inovador. Não é. A minha bisavó fazia-o. A minha avó fazia-o. A minha mãe fazia-o. Cozinhavam o que a terra lhes dava, o que o merceeiro arranjava com esforço. Era assim. Havia tempo. E com o tempo havia o resto.
A Cozinha Km zero pode também ser considerada um movimento. Engraçado referir isto mas parece que hoje temos que atribuir nomes pomposos às coisas para que tenham um significado. Pois bem, a cozinha Km zero para muitos é um movimento e, se os motores de busca não nos enganarem, atrevo-me a dizer que este movimento nasceu em Itália, inicialmente focado na minimização da logística (entenda-se transporte) mas que, pode e deve, incluir outros parâmetros tais como por exemplo: os poluentes utilizados na produção ou o tipo de embalamento utilizado e se a empresa (produtor) é responsável em termos de valorização do seu Capital Humano. É também uma iniciativa abraçada por tantos locais pelo nosso Portugal fora.
Também é certo que já é um objetivo abraçado por muitos restaurantes Internacionais e Nacionais. Aliás, já tivemos e temos vários exemplos que comprovam que o que vos digo é verdade, sejam eles exemplos que surgem na imprensa ou até mesmo aqui no meu restaurante no “a Cozinha com amigos”. Neste evento que realizo, de quando em quando, no meu restaurante, em diferentes estações do ano, seguindo o ritmo das mesmas, experimentando pelas mãos dos meus amigos cozinheiros, os melhores produtos de várias Regiões de Portugal (para já conseguimos cobrir o território continental, de Bragança ao Algarve). É um momento de partilha que procura também dar a conhecer aos nossos clientes a cozinha Km zero, feita com produtos que os meus amigos cozinheiros tão bem conhecem e que em momentos de inspiração suprema, os elevam a outras esferas.
Para mim, a cozinha Km zero é um facto. Mas também é um desafio. E entenderem isto é também entender o que me proponho fazer.
O podermos ter tudo o que desejamos, não à distância de um clique, como agora se diz mas, a uma distância suficientemente razoável, é um sonho. E digo que é um sonho porque de facto não temos tudo o que desejamos apesar de termos o suficiente para conseguirmos desenvolver uma gastronomia de excelência. Mas, não podemos ser fundamentalistas ao ponto de ambicionarmos que tudo o que iremos fazer é Km zero absoluto. Não é nem pode ser. Isso seria redutor para nós cozinheiros e para a nossa região. Isso seria castrar a nossa criatividade e a nossa vontade e desejo de inovar, de experimentar produtos diferentes, produtos oriundos de outros locais e que, através da nossa filosofia e identidade, os tornamos também nossos. Portanto, o bom senso, tem de imperar nas nossas escolhas do dia a dia e tem de imperar sobretudo, no processo criativo. No final, o que deve prevalecer é a nossa identidade e o nosso compromisso e respeito pelo produto e pelas pessoas.
E o meu bom senso diz-me que devo demonstrar que, efetivamente consigo, a partir do meu restaurante também ter uma cozinha Km zero, demonstrando-o com honestidade e de todas as formas possíveis. Um zero absoluto mas também o "mais próximo de zero". E porquê estas duas categorias? Porque a minha Guimarães dá-me muito mas se eu olhar à minha volta, a uma distância de por exemplo 50Km tenho um conjunto de locais fabulosos, perto do mar e da montanha a um clique físico de distância, onde existem tantos outros produtos magníficos para trabalhar. Produtos e amigos.
Sim, porque a cozinha Km zero ou próxima de zero é uma cozinha de amigos, os que produzem o que nós, tão apaixonadamente cozinhamos. Sim, a cozinha Km zero ou Km próximo de zero exige tempo. Ou antes, a procura do Km zero ou próximo de zero exige tempo. Tempo para procurar, tempo para estabelecer laços com o produtor, tempo para criar o conceito do prato, tempo para ensaiar, tempo para disfrutar do processo, tempo para envolver a equipa no processo, tempo para dar o que temos de melhor e o que sabemos fazer com paixão. Posso-vos dizer que desde a abertura d’a Cozinha tenho feito grandes amigos neste processo de procura. E partilhar esta amizade através da partilha de informação é também uma forma de os valorizarmos e de os promovermos. Porque a nossa Cozinha é também esta partilha.
Por fim, a cozinha Km está na génese do nosso restaurante e da nossa politica de sustentabilidade (ver artigo anterior). Desde que existimos. Hoje assumimos orgulhosamente que é possível ter alta gastronomia com produtos Km zero. O meu Km zero, o do meu epicentro.
O que eu pretendo não é mais do que pretendia há quatro anos atrás quando abri o restaurante e que está expresso na Figura anterior: desenvolver o meu conceito de tradição e inovação aliado a um caminho de desenvolvimento sustentável e sustentado, de compromisso e de respeito pelo produto e pelas pessoas.
Assim, com este projeto "a Cozinha Km zero" pretendemos atingir objetivos concretos: 1-Estudar o impacto que o Km zero tem na nossa Pegada Ecológica, sendo que, como somos um restaurante Green Key e temos desenvolvido um processo de monitorização de indicadores ambientais, temos contabilizados os custos energéticos associados às refeições que proporcionamos bem como, os consumos de água. Temos também implementada a politica de desperdício de zero desde o dia da abertura. Acreditamos que "a Cozinha Km zero" poderá fazer baixar ainda mais a nossa Pegada Ecológica e quiçá ajudar-nos a atingir um novo patamar: uma COZINHA CARBONO PRÓXIMO DE ZERO.2-Aumentar a nossa Rede local e Regional, sendo que neste momento já temos uma percentagem de utilização de produtos de 50Km na ordem dos 85% (notar que quando estendemos o raio até aos 50km acabamos por tocar outras Regiões e isso torna este processo ainda mais interessante).3-Promover e valorizar os produtores locais, porque eles fazem parte.4-Valorizar a Gastronomia Regional, mostrando que é possível inovar mantendo a tradição, usos e costumes.5-Promover a economia circular (isto é outro projeto em vista).6-Divulgar a origem dos produtos endógenos aos nossos clientes e ao Mundo, com transparência.7-Promover a alimentação saudável baseada no valor local, incrementando ainda mais a nossa participação em ações de sensibilização junto da comunidade.8-Sensibilizar os nossos colaboradores para o valor gastronómicos dos locais enquanto forma de proteção do Planeta.9-Valorizar a compra à peça eliminando o excesso de stocks, agindo preventivamente na luta contra o desperdício.10-Conhecer mais sobre os produtos, ouvir as histórias que se contam para depois as cozinhar e partilhar no nosso Blog.11-Ter tempo para procurar e usufruir do processo.12-Dar escala ao projeto, partilhando a metodologia com outros restaurantes Green Key, incentivando-os a fazerem o mesmo.
Agora que consegui explicar o que me levou a ter esta vontade de expressar nos meus Menus os pratos que são KM zero e os que são Km próximo de zero, digo-vos de seguida os pressupostos que estabeleci para a minha cozinha Km zero e a minha cozinha Km próximo de zero.
No entanto, gostaria de salvaguardar que “a Cozinha” é um restaurante de tradição e inovação onde o processo criativo e a ousadia estão sempre presentes. Assim assumo que terei pratos Km zero e Km próximo de zero da mesma forma que terei tantos outros, cujos produtos serão oriundos de outras zonas, e que me apropriarei deles com o mesmo respeito e paixão.
Posto isto, defini duas zonas que apresento no mapa: Zona 1 (circunferência a verde) que corresponde a toda a área de Guimarães e a Zona 2 que compreende uma área com “epicentro Guimarães” distando em linha reta cerca de 50km (circunferência a azul). Foram utilizadas as distâncias em linha reta calculadas através da aplicação //pt.distance.to/
Os pratos Km zero terão produtos 100% oriundos de Guimarães, incluindo a proteína. Na Cozinha Km próximo de zero constarão os pratos cujos produtos são oriundos até 50Km de Guimarães, na certeza porém, que ambas as opções originarão uma Gastronomia de excelência, apaixonada e de Km zero.
A origem dos produtos Zona 1 ou 2 irá estar identificada nos Menus, partilhando desta forma a informação com os nossos clientes de uma forma transparente.
O primeiro ensaio Cozinha Km zero zona 1
Por intermédio de um grande amigo nosso, descobri um produtor local, bem próximo do meu restaurante. Visitei-o, conversámos por longos momentos tendo nessa altura me mostrado, orgulhosamente, o que fazia e o que tinha. Sr. Teixeira de seu nome. Tínhamos tempo. Foi logo no início de janeiro. Estava de férias. Não provei o vinho mas trouxe duas garrafas que provei em casa. E que pomada era.
Já em casa a minha criatividade começou a fervilhar. Comecei a imaginar o que fazer. O Sr. Teixeira tinha a proteína, coelho, faltava-me tudo o resto. Contatei outros produtores muito próximos do meu restaurante. Fui a pé buscar as coisas. Tinha tempo. Regressei com tudo o que necessitava e parti do Km zero, com espirito experimental e criativo à procura do prato Km zero. O resultado foi surpreendente. Tinha conseguido pintar um novo quadro.
Senti-me feliz e é esta felicidade que quero continuar a levar para tudo o que fazemos n’a Cozinha.